Os hits “Vincenzo”, de Song Joong Ki, e “Encounter”, de Song Hye Kyo, estão longe de serem os únicos dramas icônicos nas carreiras dessas duas estrelas coreanas. A dupla Song já tinha um histórico de sucessos quando zeraram o jogo novamente em 2016 com o lançamento de “Descendants of the Sun”, um clássico instantâneo que sintonizou milhares de telespectadores coreanos entre fevereiro e abril daquele ano. 

Ainda no ano de sua estreia, “Descendants of the Sun” se tornou um fenômeno de exportação para outros países. Isso pode parecer algo simples se visto sob a perspectiva de 2022, quando a cultura coreana é um acontecimento totalmente global após a imensa popularidade de grupos de K-pop, o prêmio Oscar do filme Parasita, ou se pensarmos na febre que foi a série Round 6 (Squid Game). Porém, até poucos anos atrás, DOTS (nosso apelido carinhoso) era um desses poucos dramas coreanos que atravessaram fronteiras e foram longe — seja em seu enredo ou em influência cultural.

Mesmo em 2022, temos muitos motivos para considerarmos “Descendants of the Sun” uma obra cultuada e continuarmos amando esta aventura romântica médico-militar. Vamos fazer uma viagem no tempo para relembrarmos o legado desse clássico!

1. É um roteiro da Kim Eun Sook (em parceria com Kim Won Seok)

<em>Kim Eun Sook<em>

Kim Eun Sook foi considerada a melhor roteirista da Coreia em 2017, e isso se deve à sequência de sucessos de público e crítica que ela teve ao longo de anos, como “Secret Garden”, “A Gentleman’s Dignity” e “The Heirs”. Além da trilogia “Lovers”, que alcançou índices históricos de audiência em 2004 com “Lovers in Paris”.

Contudo, foi em 2016 que a roteirista iniciou sua sucessão de dramas icônicos, sendo um deles “Descendants of the Sun”, dirigido por Lee Eung Bok. No mesmo ano, Kim Eun Sook ainda repetiu a parceria com o diretor de DOTS ao lançar “Goblin” no inverno coreano. Ambos os k-dramas se tornaram “hit dramas” na Coreia, na Ásia e também internacionalmente. Hoje, eles são considerados fenômenos Hallyu, já que seus sucessos refletiram na exportação e no turismo sul-coreano. Esses dois triunfos seguidos foram essenciais para que depois Kim Eun Sook tivesse poder, em influência e investimentos, para fazer um drama de grande orçamento como “Mr. Sunshine” (2018). 

Um detalhe interessante sobre as duas histórias é que, tanto em “Descendants of the Sun” quanto “Goblin”, Kim Eun Sook abordou os temas de vida e morte. No ensaio crítico que publiquei em 2017 sobre Goblin, comentei que o drama continha a dinâmica vida e morte por meio do protagonista semi-Deus Goblin e seu amigo Ceifador.

<em>Era uma aula de química<em>

A mesma lógica está presente nos conflitos ideológicos e de personalidade entre a Dra. Kang Mo Yeon e o Yoo Shi Jin em “Descendants of the Sun” — a médica que salva vidas e o capitão que as tira. O mesmo assunto em histórias diferentes, com protagonistas distintos e ambientação totalmente opostas em um drama realista e outro de fantasia. Essa harmonia entre os dois k-dramas amplifica ainda mais seus status de clássicos.

2. Audiência e recepção

Os k-dramas de TV aberta lançados hoje em dia têm índices de audiência bem menores do que os de décadas passadas. Uma consequência natural de grandes mudanças na lógica televisiva e midiática, como os adventos da TV a cabo e internet. Atualmente, os dramas coreanos com índices mais estáveis são as longas novelas familiares exibidas aos finais de semana ou em horários mais favoráveis ao público geral.

K-dramas como “Descendants of the Sun” são primetime (do horário nobre), as minisséries transmitidas após as 21h da noite e que podem ter classificações etárias mais altas de até 18 anos. É uma programação que raramente tem números exorbitantes de audiência. Mas, DOTS foi um caso bem “fora da curva” e conseguiu atingir 41,6% de audiência em seu último episódio!

No geral, esses dramas recebem mais investimento de patrocinadores; têm roteiros fechados e previamente definidos; alguns são produções pré-gravadas com filmagens concluídas antes do lançamento; e possuem mais orçamento para elencolocações (filmagens no exterior, por exemplo) e tecnologias utilizadas (qualidade de imagem, design, efeitos especiais etc). DOTS preencheu todos esses requisitos de minissérie de luxo, e ainda “se pagou”, retornando todo o investimento que teve!

<em>Não confio em quem assiste essa cena icônica sem ter um faniquito<em>

A história romântica de cunho médico e militar também tem peso na enorme audiência. Além da prestigiada medicina, o exército possui grande relevância cultural e histórica na Coreia. Assim, “Descendants of the Sun” recebeu diversas indicações no Baeksang Arts Awards 2016, uma importante premiação de TV e cinema coreana, e levou o Grande Prêmio daquele ano, além dos prêmios de popularidade para Song Hye Kyo e Song Joong Ki.

3. Reflexo na Hallyu: turismo e publicidade

Sucesso de crítica e audiência na Coreia, “Descendants of the Sun” foi transmitido em mais sete países da Ásia, sem contar as intermináveis vendas internacionais dos direitos de exibição para diversos serviços de streaming, desde a sua transmissão. O êxito comercial de DOTS refletiu diretamente em seu país de origem, se tornando objeto importante de turismo para a Hallyu (onda cultural coreana pelo mundo).

“Descendants of the Sun” foi homenageado na principal cidade onde foi filmado, Taebaek, na província de Gangwon. O lugar se transformou num ponto turístico, com direito a estátua do casal protagonista, espaços de exposição com itens e imagens do drama e lojas de produtos temáticos à venda. Um tipo de situação que poucos k-dramas alcançam, similar ao clássico “Winter Sonata”, mais um integrante do panteão de dramas que fizeram tanto sucesso, dentro e fora do país, que ganharam suas próprias “disneylândias” — como se a nossa dramaland imaginária ganhasse vida!

<em>A estátua do casal do k drama na cidade de Taebaek<em>
<em>Vendiam tanta bugiganga quanto a família real britânica<em>

O impacto cultural foi tanto que as controvérsias envolvendo o elenco do drama abalaram o turismo e a economia de Taebaek, o que resultou em eventos cancelados e um pico de visitas de pessoas com medo que a estátua do casal fosse retirada.

Além de tudo isso, no quesito publicidade os dramas coreanos são líderes em “product-placement”, uma forma de marketing indireto que insere mensagens publicitárias no conteúdo de programas de TV, filmes etc. Com DOTS não foi diferente: o alcance foi muito grande e a empresa de cosméticos Laneige foi uma das mais sortudas, já que na época de exibição no k-drama, o batom rosa usado na telinha pela sua embaixadora oficial, Song Hye Kyo, esgotou em todas as lojas!

4. Ícone referenciado

Se algo é icônico, é referenciado, e eu já perdi as contas de quantas vezes vimos referências a “Descendants of the Sun” em outros dramas e programas de TV, não importando o canal ou a pauta da programação, DOTS estará lá. Eu gargalhei com as alusões às cenas românticas deste drama em outros k-dramas, como “Good Manager” e “Touch Your Heart”.

5. Casal Song Song

O que poderíamos considerar a pior parte de toda essa história, quase uma terrível continuação do drama — uma versão sem final feliz — eu vejo como mais um aspecto que faz de DOTS uma obra marcante. Nem mesmo a Monalisa é famosa apenas por ser um belo quadro, é também porque teve uma história conturbada de perdas e roubos.

Para algo ser cultuado precisa ter abalado a vida das pessoas, e, sem dúvida, a sequência de notícias de namoro, casamento e divórcio reais do casal que estrelou o drama permanecem na memória coletiva de muitos fãs. Desde a química inegável em tela desse casal, o nosso shipp se tornando realidade fora das telas, até a manchete precoce de separação não serão esquecidos. DOTS será sempre um “eu fui, eu tava”!

<em>Não vou colocar foto do casamento para não jogar sal na ferida<em>

Considerações finais

Kim Eun Sook é uma roteirista conhecida por dar um charme a mais em histórias aparentemente comuns. Segundo ela, “a chave é fazer personagens que são diferentes, então o público esquece o cenário clichê. É no que sou boa e é o que eu acho divertido. Eu quero que as pessoas pensem: eu já vi algo assim antes, mas ainda assim é estranhamente divertido”.

Algumas cenas de ação em “Descendants of the Sun” são meio forçadas, não passavam tensão de verdade (poxa, direção). Eu não curtia os momentos de “donzela em perigo” da protagonista e às vezes gostava mais do casal secundário do drama, interpretados por Kim Ji Won e Jin Goo. Contudo, aspectos como os clichês bem trabalhados, elenco e personagens cativantes, um bromance inesquecível, uma cinematografia deslumbrante e trilha sonora que nunca mais sai da sua cabeça tornam DOTS um excelente entretenimento.

<em>Se bem que de clichê os cenários não tinham nada<em>
<em>Eu amo um casal secundário <em>❤

Quando o drama estava prestes a terminar sua exibição em 2016, uma matéria da BBC sobre seu sucesso se encerrou com a seguinte pergunta: “O amor vai superar tudo?”. Atualmente, sim, nosso carinho por esse clássico pode nos fazer superar qualquer coisa. A vida real não é um k-drama, e, nos últimos três anos, passamos por desafios tão intensos quanto um enredo de “Descendants of the Sun”. Ressignificamos as notícias que nos desapontaram em 2019. Afinal, merecemos superar tudo, pois somos todos descendentes do mesmo Sol.

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